CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS
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CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS

A APLICAÇÃO OBRIGATÓRIA DO ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES NOS JULGAMENTOS REALIZADOS PELO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS
Cléber Renato de Oliveira

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS EMENTA: Período de apuração: 01/06/1999 a 31/03/2003 DECADÊNCIA, CONTRIBUIÇÃO SOCIAL TRIBUTO SUJEITO A HOMOLOGAÇÃO, ART. 150, §, 4º DO CTN. I – Em se tratando de tributo sujeito à homologação, a decadência reger-se-á pela regra do art. 150 § 4º do CTN, independente de ter havido ou não recolhimento por parte do contribuinte, salvo na hipótese de haver dolo, fraude ou simulação; II – Se toma indiscutível a aplicação da regra contida no § 4º do art. 150, quando constatado que o lançamento refere-se a diferença entre o valor devido e o recolhido pelo contribuinte, e ainda não constatado nenhuma das situações previstas in fine do citado dispositivo legal.RECURSO VOLUNTÁRIO PROVIDO EM PARTE.
(CARF 2a. Seção / 2a. Turma da 4a. Câmara / ACÓRDÃO 2402-01.103 / Data da sessão: 17/08/2010 / Data da Publicação 27/06/2011)

Recentemente publicada, a decisão que encabeça esse comentário deve ter sido vista com estranheza por aqueles que militam no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, uma vez que ela externa entendimento superado no âmbito administrativo, haja vista previsão regimental vigente desde 21 de dezembro de 2010, com a publicação da Portaria MF nº 586/2010.

A questão da necessidade do pagamento para fins de lançamento por homologação e a consequente fixação do marco inicial para contagem do prazo decadencial sempre foi objeto de intensos debates, primeiramente no âmbito dos Conselhos de Contribuintes e depois no CARF.

Para uma parte dos Colegiados o pagamento integrava a sistemática do lançamento por homologação e, por isso era necessário o pagamento parcial para que a contagem fosse realizada na forma do § 4º do artigo 150 do CTN. Outra parte, por sua vez, considerava o pagamento irrelevante para essa finalidade. No Acórdão em destaque, evidentemente, essa última corrente prevaleceu.

Na esfera administrativa federal, depois da extinção dos Conselhos de Contribuintes, a diferença de entendimentos era bem refletida pelo teor dos julgamentos realizados pelas 1ª, 2ª e 3ª Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, vinculadas, respectivamente, às 1ª, 2ª e 3ª Seções de Julgamento do CARF. Com efeito, as 1ª  e 2ª Turmas da CSRF possuíam entendimento no sentido de que o pagamento não era relevante para configuração do lançamento por homologação e, consequentemente,o artigo 173 do CTN se aplicava tão-somente nos casos de sonegação, fraude ou conluio; a 3ª Turma, por sua vez, entendia que o pagamento se apresentava como elemento integrante da sistemática de lançamento por homologação, não cabendo a contagem do prazo decadencial pelo artigo 150, § 4º, nos casos em que ausente o recolhimento parcial.

A despeito dessa divergência entre os diferentes Colegiados integrantes da estrutura do CARF, no Poder Judiciário a questão se resolveu, em 18.09.2009, com o julgamento do Resp nº 973.733/SC, cuja ementa é a seguinte:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO. TERMO INICIAL. ARTIGO 173, I, DO CTN. APLICAÇÃO CUMULATIVA DOS PRAZOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 150, § 4º, e 173, do CTN. IMPOSSIBILIDADE. 1. O prazo decadencial qüinqüenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito (Precedentes da Primeira Seção: REsp 766.050/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 28.11.2007, DJ 25.02.2008; AgRg nos EREsp 216.758/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 22.03.2006, DJ 10.04.2006; e EREsp 276.142/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 13.12.2004, DJ 28.02.2005). 2. É que a decadência ou caducidade, no âmbito do Direito Tributário, importa no perecimento do direito potestativo de o Fisco constituir o crédito tributário pelo lançamento, e, consoante doutrina abalizada, encontra-se regulada por cinco regras jurídicas gerais e abstratas, entre as quais figura a regra da decadência do direito de lançar nos casos de tributos sujeitos ao lançamento de ofício, ou nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação em que o contribuinte não efetua o pagamento antecipado (Eurico Marcos Diniz de Santi, “Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 163/210). 3. O dies a quo do prazo qüinqüenal da aludida regra decadencial rege-se pelo disposto no artigo 173, I, do CTN, sendo certo que o “primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível, ainda que se trate de tributos sujeitos a lançamento por homologação, revelando-se inadmissível a aplicação cumulativa/concorrente dos prazos previstos nos artigos 150, § 4º, e 173, do Codex Tributário, ante a configuração de desarrazoado prazo decadencial decenal (Alberto Xavier, “Do Lançamento no Direito Tributário Brasileiro”, 3ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2005, págs. 91/104; Luciano Amaro, “Direito Tributário Brasileiro”, 10ª ed., Ed. Saraiva, 2004, págs. 396/400; e Eurico Marcos Diniz de Santi, “Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 183/199). 5. In casu, consoante assente na origem: (i) cuida-se de tributo sujeito a lançamento por homologação; (ii) a obrigação ex lege de pagamento antecipado das contribuições previdenciárias não restou adimplida pelo contribuinte, no que concerne aos fatos imponíveis ocorridos no período de janeiro de 1991 a dezembro de 1994; e (iii) a constituição dos créditos tributários respectivos deu-se em 26.03.2001. 6. Destarte, revelam-se caducos os créditos tributários executados, tendo em vista o decurso do prazo decadencial qüinqüenal para que o Fisco efetuasse o lançamento de ofício substitutivo. 7. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.

Como medida adotada para dirimir a divergência entre decisões administrativas e judiciais e com isso evitar que a mesma questão receba tratamento diferente nas duas esferas de julgamento, em 21 de dezembro de 2010 foi publicada a Portaria MF nº 589/2010, que entre outras alterações no Regimento Interno do CARF, promoveu a inclusão do artigo 62-A, vertido nos seguintes termos:

Art. 62-A. As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo

Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional, na sistemática prevista pelos artigos 543-B e 543-C da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, deverão ser reproduzidas pelos conselheiros no julgamento dos recursos no âmbito do CARF. (Incluído pela Portaria MF nº 586, de 21 de dezembro de 2010)

Com a entrada em vigor desse preceito regimental, portanto, a reprodução do entendimento exarado pelo STJ sob o rito dos recursos repetitivos passou a ser obrigatória para os Conselheiros do CARF, não cabendo qualquer mitigação ou interpretação do entendimento externado pelos Tribunais Superiores.

Assim, o julgamento do Resp nº 973.733/SC aliado à norma de observância obrigatória inserida pelo artigo 62-A do RICARF, pôs fim ao dissídio na jurisprudência administrativa, ao estabelecer que o pagamento integra o lançamento por homologação e que, por isso, a contagem do prazo decadencial pela regra do § 4º do artigo 150 do CTN ocorre somente nos casos em que constar a existência de recolhimentos parciais.

Portanto, o entendimento formalizado na decisão comentada, por ser contrário àquele exarado pelo Superior Tribunal de Justiça, não deve ser utilizado como precedente administrativo, eis que, fatalmente, será reformado ainda na órbita administrativa, a menos que o STJ reveja o posicionamento quanto à matéria em trato.

Cléber Renato de Oliveira – Advogado. Sócio do Escritório Ferreira e Ferreira Advocacia Tributária. Pós-Graduado em Direito Tributário pelo IBET. Membro da Comissão de Direito Tributário da OAB – Subseção Americana – SP

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